Ivan Clavery
domingo, 27 de dezembro de 2009
  Anos Perdidos

Já indico pros que vão perder o tempo lendo que esse texto é bastante desconexo, avulso, sem rumo. Não foi pensado e raciocinado, foi simplesmente jogado e por isso deve ter muita incoerência e exageros. Que divertido, não?

Estamos a poucos dias dos anos 00 se acabarem. Na teoria a década acaba só em 2010, mas no imaginário coletivo acaba mesmo agora, como o século XXI que na prática começou em 2000 mesmo. Então é isso... Os anos 00 estão se acabando, mudaremos de década. Isso merece um texto.

Ontem revi um filme independente de 2005 que passou despercebido. Aqui no Brasil recebeu o nome de “People – Histórias de NY”. Em inglês se chama “The Great New Wonderful”: http://www.imdb.com/title/tt0402230/.

Enfim, quem entra no link do IMDB vê que o filme tem notas baixas dos internautas, realmente tenho dúvidas se é uma obra de arte ou não, porém sempre me impressionou essa película. É um filme que intercala diferentes histórias, coisa que foi moda forte na década, entretanto não é tanto a forma que importa nesse caso. O sentimento, o tom que o filme passa é que impressiona, pois tenho certeza que sempre que futuramente lembrar dos anos 00 vou recordar desse The Great New Wonderful.

Uma das histórias que acompanhamos é a de Emme. Emme é uma mulher de 30 e poucos anos, bonita, bem sucedida e com um namorado moderno e bonito. Moradora de Nova York, ela confecciona bolos caríssimos para festas de milionários. Chega a cobrar mais de 1000 dólares pela maioria de seus bolos artísticos super enfeitados.

Bem, em determinado momento seguimos Emme numa dessas festas. O bolo já foi comido, a festa está acabando, Emme já ganhou seu gordo cheque. Numa sala ao lado crianças cantam num karaokê. Emme entra na sala e senta numa cadeira, alguém chama as crianças e apenas uma garota sobra no palco. A menina canta uma bela canção. Na cadeira Emma começa a chorar copiosamente.

O porquê dessa situação aparentemente sem sentido ser pra mim retrato dos anos 00 é difícil de explicar. Foi uma década de transição e como todo período assim as pessoas ficam sem rumo, perdidas, desconectas. Vejo que o homem contemporâneo sofre de uma enorme inquietude. Essa inquietude angustiante surge aparentemente do nada, pois tudo parece estar bem então o que é que constantemente o aflige e o deixa infeliz? A grande complexidade do problema é que sabemos da existência do problema não obstante não sabemos que problema é esse. Essa questão já existe de forma aguda pelo menos desde os anos 70, mas nos anos 00 se acentuou por diversas razões.

Perceba que não é uma questão econômica. As dificuldades econômicas são reais e afligem pessoas e países em níveis diferentes, mas a questão material sempre existiu na história humana e não percebo isso como a questão fundamental nesse momento. Pois estamos lidando com uma transição muito mais forte. A visão de mundo e de vida do homem contemporâneo mudou em tamanha proporção que em meu ponto de vista a questão material é periférica atualmente.
Passamos os anos 00 em busca de algo, de um rumo, de um sentido.

Assim quando assisto o filme retratando essa mulher com aparentemente uma vida de sucesso e realizações chorando copiosamente sempre sinto que estou vendo um retrato de minha geração. Por que qual a diferença dos anos 00 pros 90 ou 80? Afinal já vivíamos em grandes metrópoles, tínhamos as mesmas questões, tudo que era sólido naquela época também desmanchava no ar... O que mudou na década 00? Pra mim o que aconteceu foi que reconhecemos a derrota. Reconhecemos que séculos de excesso de racionalismo nos trouxe enormes avanços, porém no fim das contas perdemos e ficamos perdidos. É uma derrota parcial, mas perdemos. Lost in Translation....

Afinal a angústia não desapareceu e sim se ampliou. Agora temos certeza que não temos certeza de nada, estamos livres, porém sem referência alguma, perdidos e com medo.

O poeta diria que é indigno não reconhecer uma derrota. Creio que finalmente reconhecemos. Citei um filme obscuro independente no começo do texto porque recém o assisti, mas poderia comentar dois muito mais reconhecidos dessa década que considero os melhores da década e tocam na mesma questão fundamental: “Lost in Translation” (Encontros e Desencontrou ou Perdidos em Toquio) e “Feliz Natal”. Ambos jogam na cara do espectador esse reconhecimento da derrota, de desespero esperançoso, por mais contraditório que possa parecer.

Mas como o Vasco na segunda divisão me ensinou sempre vai ter um novo jogo...

O título desse texto retirei de propósito de uma série de história de quadrinhos que eu li quando era criança. Uma homenagem aos filmes que mais fizeram sucesso nos anos 00: os filmes de super herói... A busca da fuga da realidade de assistir um Batman ou Homem-Aranha fez muito sucesso na década. Pois bem, uma série de quadrinhos do Homem-Aranha na minha época de criança chamava-se “Anos Perdidos”. Peter Parker vagava anos pelo país em busca de uma identidade, de um propósito, tinha dúvidas se era o real Peter Parker ou um clone (!!!). Vagava...
A verdade é que esse período foi definidor para o personagem, para seu caráter e pras suas futuras vitórias. Coisa de histórias de quadrinhos de criança a parte, considero essa década uma espécie de Anos Perdidos. E digo isso de maneira positiva, poética até. Foi uma década crucial, fundamental, e por fim, emocionante.

Como isso é um blog e não uma coluna de jornal, acho que tenho que falar um pouco sobre minha década pessoalmente. Foram muitos altos e baixos nesses 10 anos. Em 2008 creio que não via esperança, não existiam perspectivas, estava no auge do ceticismo e da desesperança. Tinha vontade de chorar numa cadeira ouvindo uma bela canção como a mulher do filme. Aí aconteceu 2009. As coisas mudaram. Para melhor. 2009 foi a transição redentora. Destino e vontade podem estar separados nesse momento e mesmo assim sigo surpreendentemente confiante.

Penso que essa nova década surge assim esparançosa não só pra mim, mas pra humanidade também. Uma espécie de nova era que pra mim já começou nesse excelente ano de 2009.

Tenho quase certeza que no fim das contas os anos 00 não terão sido minha década mais feliz, ou a década de mais sucesso ou a mais recompensadora. Mas sem dúvida terá sido a mais importante. Foram os anos que moldaram meu caráter, que definiram minha personalidade. Foram os anos que criaram um homem. São meus anos perdidos.
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Termino com Dostoiesvki e com algumas obras que considero definidoras da década:

“Não pode haver virtude sem imortalidade.”


The Strokes – Is This it? - http://www.allmusic.com/cg/amg.dll?p=amg&sql=10:fcfexq90ld0e

Lost in Translation - http://www.imdb.com/title/tt0335266/

Feliz Natal - http://www.imdb.com/title/tt1264083/

I Heart Huckabees - http://www.imdb.com/title/tt0356721/

Cão sem Dono - http://www.imdb.com/title/tt1018706/

No Country for Old Men - http://www.imdb.com/title/tt0477348/

The Great New Wonderful - http://www.imdb.com/title/tt0402230/
 
Comentários:
Demais esta ti dizer que admiro o sei jeito de se expresar. Prazer de te leer. Acho que o aspecto cultural, e me refiero desde as dicas dos nossos pais até a escola e demais, profundizan o sentimento de perdida, de confussao, de nao poder achar um rumbo. Un mundo “cínico” donde todos conhecen o precio de todo mas ninguem distingue o valor de nada. É tempo de começar a caminhar pela senda propria, sem se deixar levar pelos conceitos que conforman uma cultura com valores dislocados, uma sociedade altamente disociativa. Iván, espero que continue escrebendo para o prazer de quem lee você.
 
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