Ivan Clavery
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
  Central do Brasil e Candeia/Cartola
Ver um filme bom que foi visto há 10 anos atrás é estranho. Você lembra que gostou do filme, mas as coisas mudam tanto em 10 anos. Suas preferências, perspectivas, expectativas são completamente diferentes passados tanto tempo.

Eu sabia que Central do Brasil era um bom filme. Lembro que quando assisti tinha meus 13 anos e era um dos primeiros filmes brasileiros que eu tinha visto. Se não contarmos Trapalhões e coisas assim, provavelmente tenha sido o primeiro mesmo (com todo o respeito aos Trapalhões).

Enfim, fui assistir o filme hoje lembrando de quase nada. E que coisa. O filme faz até mais sentido se fosse feito em 2008. A história do Brasil contemporâneo escancarada ali. E profeticamente metaforizando um Brasil século XXI que cogita voltar seu olhar pro sertão e se tornar completo enfim.

Além dessa vertente nacional, é um filme que resvala nas contradições, ambigüidades e perrengues que o homem contemporâneo (nesse caso da mulher que fez a Fernanda Montenegro ir pro Oscar) sofre por não ter mais em que se segurar e apoiar. A religiosidade corta o filme a partir do momento que saímos da metrópole e entramos nas profundezas do Brasil. É um retrato de um Brasil ainda enraizado em coisas que para muitos de nós não fazem mais nenhum sentido. Essa perda de dogmas foi essencial e importante, mas traz conseqüências pesadas e fardos a carregar.

E lá está Fernanda não acreditando em nada, perdida, sem saber direito o que vai sair dessa merda toda e carregando um passado com muitas merdas cometidas por ela própria. Enfim, temos o retrato do ser contemporâneo que vive no caos urbano sem acreditar em porcaria nenhuma tentando se dar bem do jeito que for possível e que se dane o que isso possa acarretar.

Daí entra o garoto Josué. Trazendo esperança que aparenta ingenuidade, inocência mas por isso mesmo apaixonante por acreditar num improbabilidade quase gritante. E Fernanda acaba sendo carregada pelo garoto pra dentro das profundezas do Brasil. Quando leva o menino até seu destino, Fernanda se acha um pouco, se descobre. As sensações, as atmosferas, a estrada com o garoto a faz perceber que talvez o objetivo maior não seja algo tão impalpável assim. Pelo menos percebe que existe um caminho que deve ser percorrido.

É emblemático a música que percorre os créditos... ”Preciso me Encontrar” de Candeia numa versão cantada por Cartola. É uma letra tão espantosamente descritiva do atual estado das coisas que sempre que eu ouço fico embasbacado pela sensibilidade dos dois sambistas. Pois é, grande filme, grande música. As vezes a arte nos indica o caminho a ser trilhado mesmo.

 
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